terça-feira, 29 de novembro de 2011

O conteúdo de minha fossa sanitária

Ontem, minha esposa voltou do trabalho e contou que uma colega havia recentemente adotado uma cadela. Ela já estava procurando um cachorro nos diversos sites das diversas ONGs de protetores de animais quando viu um anúncio que a interessou. Era uma cachorra bonita, aparentemente mista de Labrador, cujos donos diziam que iam se mudar e que não poderiam mais ficar com ela, ou coisa assim.

Como comumente acontece com quem gosta de animais, foi uma clássica história de amor à primeira vista, a colega da minha esposa foi conhecer a cachorra e aflorou-se um carinho mútuo entre as duas. Não pensou duas vezes e a trouxe para casa. A cachorra está se adaptando muito bem, mas a adotante percebeu que ela era um pouco arredia ao contato com outras pessoas. Eis que, ao levá-la ao veterinário para a primeira consulta, foram constatados sinais de abuso físico e, pior, a cachorra esteve prenha e havia sido injetada nela uma substância abortiva, letal para os fetos. De fato, os cachorrinhos em seu útero estavam mortos e uma cirurgia de emergência salvou também a cachorra, que estava prestes a ter o mesmo destino de sua cria.

Nós mesmos temos duas cachorras. A primeira havia sido abandonada por seus antigos donos na rua muito provavelmente quando eles se deram conta de que a cachorra estava prenha. Ora, se deixavam a cachorra solta na rua, era evidente que ela teria contato com outros cachorros que buscariam cruzar com ela quando ela tivesse um cio. Neste caso, deveriam tê-la castrado. De toda a forma, ela foi encontrada por uma protetora de animais num bueiro dando de alimentar à sua recém-parida cria de dez filhotes. Nove sobreviveram. A protetora deu abrigo à mãe e aos filhotes e foi doando os filhotes. Quando a conhecemos, haviam sobrado apenas duas fêmeas de toda a cria, já grandes, com seis meses. Vira-latonas, mãe e filhas. Fomos lá supostamente para pegar uma das filhotes, mas gostamos muito da mãe, embora já fosse adulta. Nós a levamos no dia seguinte e é o melhor cachorro que tanto eu quanto minha esposa já tivemos. Obediente, esperta, amorosa e tranquila, e ainda dá sinal sempre que alguém estranho chega perto de casa. A outra cachorra nós encontramos abandonada na rua ainda filhote. Esta é uma cachorra mais clássica, chegou em casa e fez buracos no jardim, come pedra, come pano, mata ratos-do-mato, enfim, uma doida varrida. Mas é outro animal muito carinhoso que não merecia e certamente não deu motivo nenhum para ser abandonada ao lado de uma pista de rodagem em altas velocidades para morrer do jeito que foi.

E então eu me ponho a pensar: que espécie de ser humano comete uma atrocidade dessas contra um animal indefeso? Sim, indefeso, pois os mecanismos de defesa de todos os seres vivos que existem na face da Terra que não o humano pressupõem ataques de um potencial predador ou concorrente em relação a suprimento de comida, não à mente distorcida e malévola de um homem portador de absoluto livre arbítrio. Ou seja, o animal abusado, em primeiro lugar, não tem e nem pode vir a ter consciência do porquê de estar sendo maltratado. Mais, a cadela prenha, ao contrário da filha adolescente rebelde e desobediente que engravida do namoradinho, não faz a menor ideia do que seja planejamento familiar e nem saiu escondida de seus donos para se divertir. Ela simplesmente deu vazão a um instinto de sobrevivência e perpetuação da espécie dela, de forma totalmente involuntária. E já que falamos em vontade consciente e livre arbítrio, chegamos à óbvia conclusão de que o cachorro não tem nenhuma das duas. Os animais não têm maldade; se fazem mal a algo ou a alguém, o fazem única e exclusivamente para se defender de uma situação que o intelecto rudimentar deles interpreta como sendo de perigo, exista esse perigo ou não. Portanto, não existe nenhuma justificativa nem explicação minimamente plausível para quem comete qualquer tipo de abuso com animal. Pode ser um abuso efetivo ou abandono. Os animais domésticos evoluíram para confiar e precisar da presença humana, então eles buscam, sim, apoio e amparo nas pessoas que os guarnecem e não entendem o motivo quando são abandonados. O sofrimento que eles devem experimentar quando fazem isso com eles deve ser indescritível, pois.

O animal é inconveniente na sua casa? Deveria ter pensado melhor antes de trazê-lo para dentro. Ele não pediu para ser adotado por você tanto quanto nem eu nem você pedimos aos nossos respectivos pais para nascer. O cachorro te mordeu ou o gato te arranhou? Por algum motivo, os dois se sentiram ameaçados por algo que você fez e nenhum dos dois tem a consciência real ou potencial de entender que você não representava nenhuma ameaça. O cachorro ou o gato não são uma pessoa que quis te ofender e resolveu te agredir. Eles só estavam se defendendo.

Cumpro, afinal, explicar o título desta postagem: ele me vale muitíssimo mais do que a vida dos seres humanos que abusam dos animais.

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